Uma troca de governante é bastante natural e até desejável quando resultante de um processo de eleições livres e justas, com a possibilidade de que os candidatos e seus partidos apresentem suas propostas e planos para serem apreciadas pelos cidadãos eleitores que a partir dai fazem suas escolhas. Fora do processo eleitoral, nos casos do presidencialismo, só em momentos excepcionais. Tão excepcional quanto o ocorrido entre abril e maio deste ano com a destituição provisória da presidente Dilma Roussef diante da alegação de erros e crimes cometidos no exercício do cargo.
No caso dela, por supostas pedaladas fiscais. Aqui deixaremos para o Direito decidir o que é, se é crime, porque objetivamente não foi isso que a destituiu. Se comprovado que houve pedaladas fiscais, e que elas são crimes como vem se argumentando, criar-se-á, então, as mesmas condições para destituir diversos governadores de Estado que aparentemente cometeram idênticos crimes.
O caso atual parece se encaixar na categoria de excepcionalidade. Primeiro porque existem controvérsias se de fato esses supostos crimes teriam sido cometidos; segundo porque os congressistas que a destituíram não conseguiram esconder que as motivações para dar essa pena foram mais em função de contrariedades com a linha de governo do que qualquer outra coisa. Quando declararam votos, a maioria que votou pelo afastamento da presidente, o justificou com toda e qualquer outra coisa; com a defesa da família, com o nome de Deus, com a homenagem a netinhos e localidades, etc.. Apenas uma ínfima minoria por causa do assunto objetivo, tal qual foi proposto no processo.
A excepcionalidade da situação, entretanto, ainda tem outras raízes mais profundas, conforme venho argumentando nos artigos anteriores neste mesmo espaço, dos quais valem retomar dois que reputo da maior importância.
O primeiro era a necessidade de encerrar o período de ocupação do governo central por pessoas ou segmentos que não eram necessariamente da elite patrimonialista que sempre dominou a politica no país e, segundo; o que acabou se comprovando nesses dias, a necessidade imperiosa de dar algum jeito de barrar o prosseguimento das investigações que se dão no âmbito da Operação Lava Jato, capitaneada pelo juiz Sergio Moro de Curitiba.
No dia 23 de maio último a imprensa escancarou a existência de uma gravação telefônica feita por Sérgio Machado, um dirigente de uma subsidiária da Petrobrás com o agora recém-empossado e já licenciado Romero Jucá, senador do PMDB e então ministro de Planejamento do governo de Michel Temer (PMDB), vice-presidente da República que assumiu a presidência na ausência provisória da Dilma.
Na gravação apareceram sinais inequívocos que a mais importante das justificativas para apear a presidente eleita pelo voto popular Dilma Roussef, era mudar a configuração do governo para, de certa forma, influenciar nos ânimos das investigações e tentar objetivamente acabar com elas.
O receio evidente entre estes personagens, e de diversos outros deles com os nomes aparecendo na gravação, era de que a continuidade das investigações de forma isenta e justa iria afetar a todos. O óbvio e que só falta provar é que quase todos os parlamentares do PSDB e do PMDB estão comprometidos com a corrupção, antiga e recente. Com os fatos aparecendo, não há mais capacidade de convencer a sociedade que é certo às investigações seletivas apontarem tão somente e apenas para as pessoas do PT, do PP e um ou outro político menos famoso assim.
O problema da excepcionalidade é que as gravações também insinuam que existe um pacto que ouso chamar de panos quentes ou de abafa o caso, onde alguns membros do STF e expoentes das Forças Armadas estariam mais ou menos afinados nessa proposta que resumidamente é trocar o governo, tomar algumas medidas impopulares que só seriam legitimas se aprovadas em urnas e encerrar ou diminuir o ritmo das investigações. Desse jeito não se chegaria a todos os culpados e se promoveria uma grande concertação nacional para tentar convencer a todos de que a corrupção é coisa do passado ou, pelo menos, menos incisiva, pois vários criminosos teriam sido condenados.
De excepcionalidade em excepcionalidade entendamos que o que está em curso, conforme esboçado já pelo presidente interino Michel Temer ou seus ministros, são medidas que não estariam à altura desse momento único. Resumidamente podemos dizer que os caras tiram uma governante, propõe mudar o rumo das políticas que vinham sendo adotadas, mas na mediocridade de sempre oferecendo mais do mesmo, remédios que não funcionam.
Se eu disser que eles querem cortar e enxugar gastos no governo; fazer a revisão da previdência, discutir a correção dos salários, cortar direitos e vender o patrimônio público eu tenho certeza que você leitor já ouviu falar disso tudo como promessa não cumprida desde a democratização nos idos dos anos 80.
Nenhum desses salvadores da pátria, mas que querem mesmo é salvar suas próprias peles tem padrão de estadista suficiente para tributar as grandes fortunas, empreender o imposto progressivo, auditar e rediscutir o pagamento das dívidas públicas e cobrar os empresários e empresas sonegadoras contumazes e persistentes. Aliás, eles não teriam legitimidade para isso.
Uma legitimidade desse porte só é possível para quem apresentar as propostas e for aprovado em eleições livres e diretas. Como golpistas que são o máximo que podem fazer é ferrar o lado mais fraco. O mesmo de sempre. (JMN)
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